Mercedes paga alto preço por domínio e precisa lidar com rivalidade extrema entre Rosberg e Hamilton para garantir título

A Mercedes se fortaleceu, construiu a melhor unidade de força da nova era dos motores V6 em 2014, dominou amplamente a primeira parte da temporada e agora tem um alto preço a pagar: precisa lidar com a grande rivalidade que está vendo crescer entre seus dois pilotos. Nico Rosberg lidera o Mundial após 11 provas e tem apenas 11 pontos de vantagem para Lewis Hamilton na luta pelo título

Como se diz, a Mercedes fez direitinho a lição de casa no momento em que a F1 decidiu abandonar os motores aspirados V8 e substituí-los pelos turbos V6 de 1.6 L. Os alemães não estavam para brincadeira e produziram a melhor unidade de força dessa nova era, combinando quase com perfeição potência e confiabilidade. Aliado a isso, o time ainda colocou na pista o eficientíssimo W05 Hybrid, que se mostrou imune a dificuldades de qualquer natureza no que diz respeito à adequação aos diversos traçados do calendário. Juntou-se, então, dois pilotos de primeira linha. E aí não é difícil explicar o grande domínio imposto pela equipe prateada nesta primeira fase de 2014.

Enquanto as rivais e antigas protagonistas Ferrari e Red Bull — leia-se aqui Renault, também, devido ao mar de contratempos que a fabricante francesa atravessou por conta de seu errático motor — ainda patinavam com seus projetos e tentavam uma melhor adaptação às novas regras, a esquadra chefiada por Toto Wolff caminhava a passos largos na frente, deixando cada vez mais evidente que a única grande preocupação mesmo do time seria em como lidar com a dura batalha que já se desenhava entre seus dois competidores. E isso não tardou a acontecer.

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Nico Rosberg foi quem iniciou o ano vencendo. O alemão se aproveitou do primeiro infortúnio do pole Lewis Hamilton em Melbourne e tomou para si os primeiros 25 pontos em uma corrida tumultuada na Austrália.

Nico Rosberg abriu a temporada com um verdadeiro desfile na Austrália (Foto: Getty Images)

Só que aí Hamilton decidiu que não era hora de dar moleza para o azar e sacou quatro assombrosos triunfos seguidos: Malásia, Bahrein, China e Espanha. O desempenho acachapante do britânico deixou a impressão de que seria ele o responsável por liderar os prateados.

O GP em Sakhir foi um bom exemplo. Líder, Lewis teve de segurar o ímpeto de Nico na pista árabe. Os dois travaram um duelo espetacular, especialmente nas voltas finais, em que chegaram a trocar de posições lindamente, mas o inglês não esmoreceu e, mesmo com pneus mais desgastados, foi capaz se manter à frente, usando todo o arrojo e a agressividade que lhe são peculiares. A posição da Mercedes frente ao primeiro grande embate dos dois foi de extrema cautela e neutralidade, entretanto. 

Inteligente, o filho de Keke soube evitar o choque com o inglês — na pista e fora dela — e foi segundo em todas as vitórias do colega nessa fase do campeonato, deixando claro que se tornaria um adversário cada vez mais duro também. Ainda assim, Nico teve de chegar a Mônaco três pontos atrás de Hamilton, que finalmente havia conseguido pular para a ponta do campeonato.

E foi no Principado o palco do primeiro desentendimento da dupla. Foi lá também que a Mercedes precisou pela primeira vez entrar em cena para acalmar os ânimos. Explicando: no fim do Q3, Rosberg e Hamilton saíram para as voltas finais e decisivas. O alemão já era dono do melhor tempo da sessão e, na curva Mirabeau, acabou escapando da pista depois de frear tarde demais. Não bateu, mas o erro provocou bandeira amarela no local, o que obrigou Lewis, que vinha ligeiramente atrás, a tirar o pé, perdendo, assim, a chance de ouro de largar na pole.

Olhando assim, pareceu um incidente corriqueiro. Os comissários até investigaram o caso, conversaram com o piloto e decidiram que nada demais havia acontecido ali. Só que Hamilton não se mostrou nada contente e discordou dos representantes da FIA.

Ainda no Parque Fechado, o britânico não fez questão alguma de disfarçar a insatisfação. Depois, ainda deu a entender que o colega fez de propósito, porque sabidamente a pole é ainda mais significativa em um circuito tão travado e manhoso quanto o de Monte Carlo. Rosberg sustentou a tese do erro e tratou de se afastar de qualquer polêmica. Em outras palavras, o germânico não caiu na armadilha — tendo feito de propósito ou não. 

A estratégia deu certo. O alemão venceu de ponta a ponta o GP de Mônaco e reassumiu a liderança do campeonato, com quatro pontos de dianteira. Hamilton foi o segundo, mas o resultado foi quase uma derrota. Lewis teve de engolir o triunfo do companheiro e lidar com o primeiro grande revés do ano.

A Mercedes se viu no olho do furacão de uma enorme polêmica. Ainda se acostumando com o papel de protagonista, a equipe prateada precisou se posicionar e agir rápido. Toto Wolff não perdeu a calma e colocou panos quentes, tentando resolver tudo na base da conversa, mas o estrago já estava feito. E a relação de Nico e Lewis nunca mais seria a mesma. 

A pole no GP de Mônaco foi fundamental para a segunda vitória de Nico Rosberg (Foto: Mercedes)

A prova seguinte foi perturbadora para o time também. No Canadá, Rosberg e Hamilton dividiram a primeira fila. O líder do campeonato foi implacável na largada e se valeu da agressividade que tanto marca o colega para defender bem a primeira posição. Os dois, então, começaram a protagonizar um duelo particular, com o inglês sempre na cola do alemão. 

Mas aí a Mercedes enfrentou o primeiro grande problema de confiabilidade. Os dois carros tiveram contratempos com as baterias de armazenamento de energia cinética e perderam potência. Lewis, como agravante, ainda teve de lidar com um aquecimento dos freios traseiros. O infortúnio acabou por fazer o britânico abandonar a corrida.

Já Nico terminou, mas em segundo, também tendo de administrar a falta de força. Sem Lewis e com Rosberg fora do degrau mais alto do pódio, Montreal acompanhou a primeira vitória de carro não Mercedes ano e o primeiro triunfo de Daniel Ricciardo, um dos grandes destaques da temporada.

Dessa forma, a regularidade de Nico o fez deixar a América do Norte com uma importante vantagem de 22 pontos para o colega. No retorno à Europa, Rosberg se mostrou fortalecido e venceu na Áustria apesar ter perdido o lugar na primeira fila para as Williams de Valtteri Bottas e Felipe Massa. Mesmo em segundo, depois de uma prova de recuperação, Lewis viu a diferença crescer ainda mais: 29 pontos.

Só que aí a sorte sorriu para o inglês em casa. Mais que isso, o desempenho de Hamilton foi uma demonstração de força mental. Na classificação, Rosberg se mostrou mais atento, apostou em uma pista mais seca no fim do Q3, depois uma sessão marcada por chuva. O que ocorre é que Nico conquistou a pole em um misto de intuição e ousadia. Lewis, por outro lado, não viu a oportunidade de melhorar e sequer tentou uma última volta rápida. Assim, teve de largar somente em sexto, com o colega na pole.

Hamilton partiu para o ataque e foi galgando posições, enquanto o colega de time liderava a prova. Lewis usou bem os pit-stops também para crescer e, quando a viu a chance de vitória, não desperdiçou. Foi em Silverstone que Rosberg teve o primeiro abandono. Nico precisou deixar a corrida, já depois da metade, por conta de uma falha no câmbio.

Lewis venceu em casa e reduziu para quatro pontos a desvantagem para o líder. Assim, a dupla chegou à Alemanha. E em casa, foi a vez de Rosberg celebrar o triunfo enquanto Hamilton não teve vida fácil.

O britânico sofreu um acidente ainda no Q1, provocado por uma falha no disco de freio. Por conta do incidente, Hamilton largou em 20o, depois de ter sido punido pela inevitável da caixa de câmbio. Lewis não se abateu com revés e foi à luta. No fim, travou um duelo com Valtteri Bottas pelo segundo lugar, mas teve mesmo que cruzar a linha de chegada em terceiro, minimizando assim os prejuízos, já Rosberg subiu mais uma vez ao lugar mais alto do pódio.

Hamilton tem sofrido mais que Rosberg com problemas mecânicos. E não está nada contente (Foto: Getty Images)

Como desgraça pouca é bobagem, uma semana depois, Hamilton novamente se viu fora da classificação ainda no Q1. Na Hungria, uma falha na mangueira de combustível provocou um vazamento e um incêndio do carro do inglês ainda na primeira fase do treino decisivo. Desta vez, o infortúnio obrigou o campeão de 2008 a sair do pit-lane. Uma vez mais, Nico iniciou a prova na pole. Só Hungaroring preparou uma cilada para os pilotos.

A tempestade que desabou sobre a pista pouco antes da largada embaralhou as estratégias. Depois, um acidente ainda no início da corrida causou a primeira entrada do safety-car, o que contribuiu para confundir a vida das equipes nos pits. A Mercedes optou por táticas diferentes para os seus dois pilotos, que se encontraram na metade para o fim da prova em condições de vencer a corrida por conta dos planos criados nos boxes.

E aí veio a primeira ordem de equipe da Mercedes em 2014. Como Rosberg teria de parar uma vez a mais, a esquadra pediu para Hamilton abrir passagem. Os dois lutavam pelo quarto posto naquele momento. De dentro do carro, Lewis entendeu bem o que significava a tática e que isso provavelmente colocaria o rival em uma forte posição para ganhar. Ignorou solenemente a ordem.

No fim, Hamilton foi terceiro, após ter lutado pela vitória diretamente com Alonso e Ricciardo — o vencedor. Rosberg foi quarto. O resultado ainda deixou Nico na liderança, com 11 pontos de vantagem. 

É assim que os dois vão retornar para a segunda fase do Mundial, no fim de agosto, em Spa-Francorchamps

Só que a prova da Hungria foi uma pouco mais emblemática que isso. O pânico que a equipe alemã viveu nos boxes mostrou certa fragilidade do time em lidar com decisões rápidas, em impor sua vontade e como lidar com a relação entre seus dois pilotos. Enquanto Rosberg se mostrou mais compreensível com a situação, embora não tenha concordado, Lewis agiu por conta própria, ignorando o chamado dos pits. 

Após a corrida, o chefão Toto Wolff quis minimizar os estragos e os possíveis desdobramentos. O austríaco evitou o papel de juiz e disse que entendeu a atitude de Hamilton. Mas não deixou deenfatizar que os dois pilotos precisam obedecer aos comandos de quem está no pit-wall. O tom usado por Wolff aos jornalistas foi firme. O dirigente não gostou do aconteceu em Hungaroring, nem nos boxes e nem na pista, mas optou pelo discurso ameno de ‘vamos sentar e conversar’. Lavou em casa a roupa suja.

Finalmente, ficou claro que a ficha caiu na Mercedes. Ou seja, é a melhor equipe do grid e possui dois dos melhores pilotos da F1, que vão brigar até o fim pelo título e não vão se colocar em posição de submissão à equipe. 

O domínio acachapante do Mundial está cobrando o seu preço, e é alto, assim como a política de igualdade condições imposta pela equipe prateada desde o início do ano. A questão é ver até quando a Mercedes conseguirá segurar as rédeas e garantir, de fato, os tão sonhados títulos de Pilotos e Construtores. 

Hamilton, em dúvida, saiu fortalecido do que aconteceu na pista magiar. De forma alguma pode ser descartado da briga, ainda mais com as atuações espetaculares das últimas corridas: não se deixou abalar e soube se impor. Rosberg, por outro lado, segue como líder e deve se valer mais algumas vezes de suas duas grandes características: a frieza e a regularidade. Os dados já foram lançados.

Rosberg e Hamilton prometem lutar até o fim pelo título de 2014 (Foto: Getty Images)

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