Único brasileiro no TT da Ilha de Man, Paschoalin se prepara para 2ª participação e vê top-40 como meta

Depois de estrear em 2013, Rafael Paschoalin se prepara para participar do TT da Ilha de Man pela segunda vez. Brasileiro destacou desafios da prova na pequena ilha e colocou o top-40 como meta para este ano

Aos 31 anos, Rafael Paschoalin se prepara para encarar o Troféu Turista da Ilha de Man pela segunda vez. Depois de vencer o temido Circuito da Montanha em 2013, o brasileiro embarcou rumo à pequena ilha de 572 km² localizada entre Inglaterra, Escócia e Irlanda do Norte para encarar o desafio mais uma vez.

 
Realizado desde 1907, o TT da Ilha de Man é uma das mais lendárias – e perigosas – provas mundo. Disputado em um traçado de pouco mais de 60 km com 256 curvas, as motos rodam a uma velocidade média de 208 km/h em vias públicas, longe da segurança dos circuitos permanentes que recebem os campeonatos mundiais.
Rafael Paschoalin vai disputar o TT da Ilha de Man pela segunda vez em 2014 (Foto: Felipe Tesser)
Ao longo desses mais de cem anos de história, mais de 230 pilotos já perderam a vida no TT da Ilha de Man, que tem uma assustadora média de cerca de duas mortes por edição. O lema de ‘prova mais perigosa do mundo’, entretanto, não assusta Paschoalin, que, de novo, correu atrás dos recursos necessários para disputar a famosa prova.
 
Levantar os fundos, no entanto, não uma foi tarefa simples e, por pouco, Rafael não ficou de fora da edição 2014. Em uma coletiva de imprensa realizada no Autódromo de Interlagos, Paschoalin contou que uma amizade construída na Ilha de Man viabilizou sua presença no TT. 
 
“O James [Regan], que é o meu principal patrocinador, é dono da Santa Cruz, uma empresa que faz manutenção em plataformas de petróleo. A gente se conheceu no TT do ano passado. Ele passou por lá e depois a gente se encontrou aqui no Brasil, lá em São José dos Campos, onde ele mora”, relatou Paschoalin. “O James é um fanático pelo TT, ele tem uma coleção de coisas, é um alucinado nessa prova e este ano, em fevereiro, quando ele me ligou perguntando como estavam as coisas, eu falei que não ia andar”, continuou.
 
“Eu realmente não ia andar. E ele disse: ‘Não, você vai andar. A gente vai dar um jeito’. E aí tudo aconteceu. Eu devo muito a ele. Se não fosse por ele, não teria brasileiro no TT neste ano”, frisou Rafael. 
 
Ao contrário do ano passado, quando correu utilizando equipamento Ducati, Paschoalin vai contar com um modelo da Honda. “Eu chego na Inglaterra na segunda-feira e vou comprar uma CBR1000 2012, igual a essa que eu utilizo aqui, que a Honda me cedeu”, explicou. “A gente vai ter uma moto exatamente igual lá, a gente vai colocar essas peças de performance, mais o tanque de 24 litros, que já está lá”, seguiu. 
Fã do TT, James Regan foi fundamental para viabilizar ida de Paschoalin para a prova na Ilha de Man (Foto: Felipe Tesser)
“Eu chego lá na Inglaterra, compro a moto, faço todas as modificações com a ajuda do Rhalf Lo Turco, meu amigo brasileiro que este ano está competindo no Campeonato Britânico de Superbike, o campeonato mais forte que tem, o campeonato nacional mais absurdo”, falou. “No dia 20 de maio eu vou para a Ilha de Man para acertar os últimos detalhes para a prova que começa no dia 24. Do dia 24 ao dia 31 são treinos. Os treinos lá acontecem entre 18h e 22h, lá escurece bem tarde, e todas as categorias vão treinando alternado para depois, na semana seguinte, acontecerem as corridas”, detalhou Rafael.
 
Assim como em 2013, Rafael vai disputar três classes no TT: “Eu vou andar este ano nas mesmas categorias que eu andei no ano passado: Superbike, Superstock e Sênior”.
 
Mesmo correndo em três categorias, o piloto, que também é instrutor na Honda Júnior Cup, uma divisão de base da Superbike Series, vê suas melhores chances na Superstock. 
 
“A Superstock é uma moto com poucas modificações. É uma moto quase de série, com alguns upgrades e não pode nada muito especial”, apontou. “Ela tem um upgrade de freio, ela tem escape completo…”, continuou.
 
“Nas categorias Superbike e Sênior, a moto é a mesma. Uma moto completamente modificada”, ressaltou. “Já é outro nível de motocicleta. Não dá para comparar uma coisa com a outra. Em um circuito fechado como Interlagos, a gente estaria falando de, sei lá, 2s. 3s talvez”, ponderou. 
 
Questionado pelo GRANDE PRÊMIO se vai para a Ilha de Man em uma condição melhor do que no ano passado, Paschoalin disse que sim, mas frisou que isso não significa que ele esteja lucrando ou que não tenha investido dinheiro do bolso.
 
“Este ano a gente tem mais apoio, a gente tem parceiros importantes. A própria Honda, com o apoio que deu, cedendo as motocicletas aqui no Brasil, já foi uma ajuda tremenda”, avaliou. “A gente tem a Santa Cruz, óbvio, principal patrocinador, mas parcerias antigas como Race Tech e LS2, Metzeler que sempre me apoiou. Lá fora, quando se fala em Road Racing, o foco é na Metzeler mesmo, então este ano está mais fácil”, listou. 
 
“Não significa que eu não estou pondo dinheiro do bolso ou que eu estou ganhando dinheiro. Eu acredito que, infelizmente, no Brasil, ainda vai demorar um pouco para isso acontecer com os pilotos”, lamentou. 
 
Traçando metas
 
Para a estreia no TT, Rafael embarcou para a Ilha de Man com metas simples: classificar e voltar vivo. Nesta segunda edição, os objetivos iniciais continuam lá, mas agora a preocupação com a performance também se faz presente.
 
“O objetivo este ano é ficar entre os top-40. Acho que esta é uma marca muito boa, ainda mais com a estreia fatídica que eu tive, com todos os problemas”, considerou. “No ano passado eu só dei 12 voltas, a gente teve uma tremenda falta de sorte e este ano eu espero conseguir andar mais normal”, torceu. 
Rafael Paschoalin vai contar com uma Honda CBR1000 no TT da Ilha de Man (Foto: Felipe Tesser)
“Correndo nessas três categorias, vou dar mais ou menos 30 voltas, então eu espero que este ano eu consiga isso para atingir, quem sabe, 201 km/h de média, que é um tempo bom, é uma velocidade boa para um segundo ano”, declarou. “Se eu conseguir ficar entre os top-40 na classe Superstock, que é justamente a categoria mais adequada para a minha moto, eu vou ficar bem satisfeito, tendo em vista que largam mais ou menos 80 motos por categoria”.
 
Mesmo com objetivos claros e indo para sua segunda participação, Paschoalin sabe que ainda é um iniciante no mundo do TT da Ilha de Man.
 
“Dizem que demora, em média, três anos para decorar o traçado, para conseguir andar rápido”, explicou. “Lá na Ilha a gente tem a ajuda do Milky Quayle, um piloto veterano que ganhou em 2003, e ele narra uma volta inteira, falando cada detalhe da pista em inglês. Então a gente fica ligado nesse vídeo”, relatou.
 
Perguntado pelo GP sobre o que mudou em sua preparação para este segundo ano em Man, Paschoalin explicou que viaja com mais horas de pista, mas não tão em forma como em 2013.
 
“Este ano está um pouco diferente em relação ao ano passado. No ano passado eu fui sem andar de moto. Eu fiz um shakedown com a moto aqui, me derrubaram na segunda curva e depois eu não andei quase. Eu fui sem experiência de moto, eu fui enferrujado de moto”, reconheceu. “Este ano eu estou correndo a Superbike Series com a [equipe] Bikers, já estou utilizando a CBR1000, que é a moto que eu vou utilizar lá, então eu vou com muito mais horas de voo, mais adaptado à moto. Vou muito mais familiarizado, mais à vontade”, frisou. 
 
“Em contrapartida, eu não estou tão bem fisicamente como eu estava no ano passado, justamente pela quantidade de trabalho. Infelizmente, eu ainda não estou tão bem preparado como eu estava no ano passado e o TT é uma prova muito desgastante”, admitiu. “A prova da Sênior dura 1h30, sem parar, e com um estresse psicológico e físico absurdo”, completou.
 
Histórias do TT
 
Após participar do TT pela primeira vez, Paschoalin tem hoje uma ideia mais real do que é a prova na pequena ilha, mas não são os desafios das 256 curvas que ficaram em sua memória.
Questionado pelo GRANDE PRÊMIO se o TT da Ilha de Man era realmente como ele imaginava, Rafael relembrou sua trajetória para chegar até lá. “Eu tentei durante seis anos me inscrever no TT e a resposta sempre foi não, não, não”, contou. “Aí um ano eles falaram sim. Eu fiquei feliz da vida. 15 dias antes da prova eles falaram: ‘Não, mudamos de ideia’. Então foi bem duro chegar lá”, reforçou. 
Rafael Paschoalin gravou no corpo a aventura na Ilha de Man (Foto: Felipe Tesser)
“Eu tive que fazer as provas de rua, fiz na Irlanda, fiz na China, e depois que eu cheguei lá, o meu pai estava presente, a gente viu a bandeira do Brasil tremulando lá, foi uma sensação de dever cumprido, foi muito legal, mas, ao mesmo tempo, eu sou um cara que me cobro muito”, comentou. “Eu lembro que quando eu terminei a prova da Superbike, que foi a primeira corrida e a única que eu terminei, eu estava puto da vida, porque eu tinha andado mais lento do que eu andei nos treinos e não tinha atingido a minha meta pessoal. Enquanto tava todo mundo feliz porque eu tinha voltado vivo e ganhado uma medalha, eu estava revoltado”, relatou. 
 
“Eu tenho essa característica e, no final das contas, quando eu voltei eu percebi que é legal participar do TT, é legal ser o primeiro brasileiro, é legal atingir um objetivo desses, mas o que valeu muito mais foram todas as amizades que eu fiz com isso, ter conhecido o Rhalf, ter conhecido esses caras.. Isso é o que vale depois”, defendeu. “As histórias que a gente tem para contar. Participar, colocar o nome na história, de certa forma, é bacana, é legal, mas, para mim, o que conta mesmo é o roteiro desta história, tudo que a gente fez para chegar lá”, continuou. 
 
Com experiência na maior prova da modalidade, o brasileiro também cita as características peculiares do TT, onde os novatos são rapidamente abraçados pelos pilotos mais experientes.
 
“O TT é sensacional por isso. É diferente do circo da MotoGP, da Superbike. Claro que, comparado com o automobilismo, os pilotos de moto são bem mais solícitos, mas eu lembro que a primeira vez que eu vi o John McGuinness lavando o motorhome dele, a gente conversou, ele falou que já veio para o Brasil e tal, e ele terminou dizendo: ‘A gente vai pro bar tomar uma cerveja, vamos lá!’. Então foi absurdo isso, o nome máximo do TT hoje e o cara me chamou para tomar uma cerveja.”
 
“Outra coisa que é legal no TT, eu lembro que teve um treino misto, com todas as categorias andando junto e tal, com umas bicilíndricas, a Kawasaki RCZ e a Suzuki SP, que são bem mais lentas, mas, como a gente estava andando pela primeira vez, os caras eram mais rápidos”, recordou. “Aí eu estava com um colete laranja, que é o colete de novato, do nada passou um cara, bateu na rabeta acenando do tipo: ‘Me segue’. Ele sabia que eu era um novato e tentou me ajudar de alguma forma. Sem eu ter pedido, sem eu conhecê-lo. A atmosfera lá é diferente. É todo mundo contra a pista, não é ninguém contra ninguém”, resumiu. 
 
Por fim, Rafael explicou que no TT não se trata de andar sempre no limite, mas de ter sempre uma margem de segurança. “O TT é como um rali. É igual o Rali dos Sertões ou o Rali Dakar. Você não pode andar dando 100%, porque você não tem margem para erro”, opinou. “Em um rali, mesmo que você se machuque, você abandona o rali. No TT, você morre. No rali a gente sempre deixa uma margem de segurança. A diferença é que essa margem é absurda”. 
 
“Quando você vê o John McGuinness passando ou o Michael Dunlop passando, você fala: ‘Cadê a margem dos caras?’. Porque eles andam escorregando, no limite, com guia, poste, sarjeta do outro lado da rua”, relatou. “Leva tempo. A minha ideia é participar do TT nos próximos dez anos e, quem sabe, com 40 anos estar próximo dos primeiros e até ganhando”, encerrou.
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