Diários de Viagem: Londres, muito prazer

Sempre quis conhecer Londres. É uma cidade que, se alguém me perguntasse até dez dias atrás, eu diria que gostaria de morar. Até que tive a oportunidade de, enfim, encontrá-la. Agora digo: moraria sem pensar duas vezes, se tivesse a oportunidade

Ah, o Big Ben (Foto: Renan do Couto/Grande Prêmio)

Sempre quis conhecer Londres. Acho que é a cidade europeia que eu mais tinha vontade de visitar. Futebol, pubs, música, Big Ben, Trafalgar Square, metrô, ônibus de dois andares, volante do lado errado, Estação da Luz, quer dizer, King’s Cross, Plataforma 9 ¾, Rio Tâmisa, Palácio de Buckingham, London’s Eye, Abbey Road, Arsenal, e por aí vai. É uma cidade que, se alguém me perguntasse até dez dias atrás, eu diria que gostaria de morar. Até que tive a oportunidade de, enfim, encontrá-la.

São Paulo, sexta-feira, 21 de junho de 2013. Saí de uma Avenida Paulista parada por mais protestos e fui para casa pela última vez. A mala, é claro, ainda estava pendente. Faltava preparar algumas coisas para a viagem de cinco semanas para a Europa. Feito isso, dormi por algumas poucas três horas e meia na minha cama antes de acordar no sábado e partir em direção ao aeroporto de Guarulhos.

Claro que a ansiedade era enorme por viajar pela primeira vez para cobrir uma corrida de F1. Mas também havia uma pontinha de ansiedade pela chance de ir pela primeira vez para Londres, ainda que eu nem fosse ficar hospedado por lá.

De qualquer maneira, ia demorar até eu chegar em Londres. O voo não era direto e, sim, com escala em Charlotte, na Carolina do Norte. E lá fui eu, de novo para os Estados Unidos depois de três meses. Impressionante como tudo é igual lá: a sala da imigração é idêntica a do aeroporto de Orlando. Como as minhas viagens têm que ter uma dose razoável de emoção, fui mandado para a inspeção secundária. Mas o problema foi resolvido em minutos, nada grave, e parti para pegar a conexão para a Inglaterra. Mais sete horas de voo e cheguei a Heathrow, às 8h20 locais. O pouso foi o mais tranquilo da minha vida: estava dormindo e só acordei quando o avião já estava taxeando pela pista.

Lá, outra dose de emoção. Mas não, não foi por causa da imigração britânica. Foi por causa da minha mala. Não queiram passar pela sensação de ver a esteira de bagagens encher, esvaziar e a sua mala não chegar. É como combinar de encontrar com alguém e a pessoa furar.

Fui identificar-me no balcão da companhia, onde um indiano bem humorado me atendeu.

“Você não deveria estar no Brasil protestando contra o seu governo”, perguntou ele.

“Eu estava”, respondi.

Mais alguns instantes e o amigo indiano conseguiu localizar a mala.

“Ela não entrou no avião, ficou lá nos Estados Unidos. Nesses casos, normalmente ela vem no mesmo voo, no dia seguinte. Então entregaremos no local onde você vai ficar”, explicou.

Costumo dizer que tudo na vida tem um lado bom. Minha mala estava pesada e eu pretendia andar com ela pela cidade. Pelo menos eu não precisaria ficar arrastando quase 20 kg de um lado para o outro.

Desembarquei e logo encontrei as placas que indicavam o caminho para o ‘Underground’. Heathrow fica bem longe do centro de Londres, mas o metrô chega a cada um de seus cinco terminais. Quando fui comprar as passagens, fiquei espantado com o preço. Saí de um Brasil que protestou e muito por centavos na passagem para chegar a um lugar onde alguns trajetos do metrô custam £ 5 (quase R$ 20). Imagino que esse valor não seja um grande problema para os ingleses, mas, para nós, brasileiros, que precisamos passar pela árdua conversão, é um preço bem salgado.

O metrô de Londres pode ser velho, pode cheirar mal em algumas estações, os trens podem ser estreitos, mas o sistema é muito bom. Metrô é que nem ponto de ônibus: andando pela rua, você passa por vários. Mas ainda não cheguei à parte da minha caminhada.

Foi de dentro do metrô que vi Londres pela primeira vez. A Piccadily Line começa subterrânea, em Heathrow, passa por cima da terra em alguns pontos e volta a ser subterrânea no centro da cidade. Quando o trem saiu debaixo da terra, pude avistar as casas, todas no mesmo estilo, com os tijolos à vista, grudadas umas nas outras. Enquanto isso, o trem deixa para trás estações que parecem aquelas da CPTM antes de reformarem, sabem? Outras que nem isso, que são completamente abertas. Isso deve complicar um pouco a vida de muita gente nos muitos dias de chuva do ano.

Quase uma hora depois, o trem finalmente chegou à estação Piccadily Circus, onde eu desceria. E, bem, acho que não poderia ter escolhido uma estação melhor para descer. Saí da minúscula plataforma, subi aquelas escadas mais antigas que qualquer projeto de metrô da cidade de São Paulo, olhei em volta e disse: “Foda”.

O Piccadily Circus foi o primeiro ponto de Londres pelo qual caminhei (Foto: Renan do Couto/Grande Prêmio)

Então comecei a andar. Sem rumo, mas não completamente sem rumo. Tinha no bolso um mapa daqueles que se pega de graça no aeroporto e sabia para que lado eu queria ir. Baseei-me no meu apurado senso de direção e saí andando. Até as crianças falavam inglês! Tá, eu tinha jurado para mim mesmo que não faria essa piada. Desculpem. Podem fechar a janela se quiserem.

Se você resistiu, obrigado. Continuemos, então, a andar pelo centro de Londres. Cinemas de rua, restaurantes diversos, pessoas andando de bicicleta, fossem elas próprias ou emprestadas em estações do Barclays, que nem tem as do Itaú em São Paulo. Eu tomava cuidado, claro, para olhar para o lado certo da rua. Se bem que fica bem sinalizado, no chão, o lado para onde se deve olhar antes de atravessar a rua. É bom se preocupar com os turistas.

Ah, o Big Ben (Foto: Renan do Couto/Grande Prêmio)

Desci até o Rio Tâmisa, vi de longe a London’s Eye, passei por um memorial em homenagem aos pilotos da RAF na Segunda Guerra Mundial e então ouvi algumas badaladas. Olhei para cima e lá estava o Grande Ben, sempre pontual.

Estava com fome e não podia me alongar muito mais, tinha que ir para Luton, 60 km ao norte de Londres. Nesse caminho de volta, deparei-me com uma excursão escolar em pleno domingo diante da Downing Street, a rua onde fica a casa do Primeiro Ministro, e, alguns metros depois, com um McDonald’s. Tava com fome, fui lá mesmo.

Depois do rango, hora de ir para King Cross, que é mesmo igual à Estação da Luz. Mas tem mais gente na fila do lado de fora para tirar uma foto na Plataforma 9 ¾ do que para pegar trens. Essa nem é de verdade, fica na entrada da estação, mas certeza que tem gente que procura pela verdadeira entre as plataformas reais.

Ali, eu me despedi de Londres pela primeira vez ao subir no trem em direção a Luton, outra agradabilíssima cidade no interior da Inglaterra. Ainda fui para Towcester, um pequeno vilarejo nos arredores de Silverstone, mas igualmente agradável, onde fiquei hospedado em uma casa do século XVI durante a cobertura do GP da Inglaterra.

A primeira vez a gente nunca esquece (Foto: Renan do Couto/Grande Prêmio)

Chegar a Silverstone no primeiro dia, sem carro, foi uma aventura. Um ônibus de Luton para Milton Keynes, outro ônibus de Milton Keynes para Towcester – nunca vi um ônibus dar tantas voltas na minha vida até finalmente chegar em "Towstar", como se fala com o british accent – um terceiro ônibus de Towcester para Silverstone, mais uma caminhada de uns 5 km. Ainda bem que, ao contrário do que acontece na maior parte do ano na Inglaterra, não estava chovendo. Tudo tem seu lado bom.

Nessa última parte da jornada, ainda pude cumprir a boa ação do dia ao atuar como tradutor de dois argentinos que tentavam conversar com o motorista do ônibus, que não falava espanhol. Após iniciarem a viagem pela Europa na Espanha, onde assistiram ao GP da Catalunha de MotoGP, foram para a Inglaterra e decidiram tentar chegar de Londres a Silverstone, de ônibus, na quinta-feira que antecedia o GP. Isso sem credencial, nem ingresso, nem nada. Só com a cara e a coragem, antes de voltar para a Argentina no dia seguinte. Chegando a Silverstone, separei-me deles e não sei o que conseguiram. Se não conseguiram nada, seria realmente uma pena. Posso falar que sei como é difícil chegar lá de ônibus.

Mas valeu a pena. Peguei a credencial, minha primeira de F1, e entrei no autódromo, um templo da velocidade. É impressionante como ele é grande. Interlagos, por exemplo, 'cresce para dentro'. Silverstone não, o traçado é extenso e o terreno mesmo deve ter quase 5 km de uma ponta à outra. Esse foi o meu escritório por quatro dias. Vidão.

Na segunda-feira, voltei cedo para Londres, mas o voo para Frankfurt, na Alemanha, era só às 19h. Deixei a mala em um guarda volumes em Heathrow e, de metrô, fui ao lugar que jurava para mim mesmo que não deixaria de visitar quando fosse à Inglaterra: o Emirates. É demais. E é impressionante como o Arsenal se esforça de todas as formas para criar uma aura em torno do estádio que substituiu o histórico Highbury. Os símbolos do time espalhados por todos os cantos e muitas referências a Arsène Wenger. Por mais que seja questionado por alguns fracassos recentes do clube, o francês é tratado como ídolo.

E então peguei o metrô da Piccadily Line de novo com direção a Heathrow, para embarcar com destino a um novo país, a Alemanha. Com uma certeza: a Inglaterra é um país onde eu moraria sem pensar duas vezes, se tivesse a oportunidade. Certamente, ali pelos lados do Highbury, em Londres. Quem sabe um dia.

Espero voltar logo (Foto: Renan do Couto/Grande Prêmio)

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