Conta-giro: Momento de maior emoção nas corridas, largadas são novo alvo da FIA para melhorar F1

A partir do GP da Bélgica deste fim de semana, as largadas da F1 começarão a sofrer mudanças para se tornarem mais “humanas” e movimentadas. O GRANDE PRÊMIO investigou como o apagar das luzes – ou o tremular da bandeira verde – interfere no andamento de uma corrida

Se no futebol, espera-se pelo gol, e, no basquete, pelos segundos finais da partida, o automobilismo consegue ser um dos poucos esportes – senão o único – que já começa com seu momento de maior emoção.
 
Na hora da largada, os pilotos estão todos próximos uns dos outros, aguardando o sinal para acelerar. É quando a probabilidade de ultrapassagens é maior – e de acidentes também. E, ainda que uma corrida não seja ganha na primeira curva, o que acontece nos metros iniciais de uma prova pode ser crucial para o seu desenrolar e o seu desfecho. Que o digam as duas últimas etapas do Mundial de F1.
 
Em Silverstone, no início de julho, as duas Williams passaram as duas Mercedes na largada e ditaram o ritmo da primeira parte da prova. Criou-se ali uma enorme expectativa por aquela que poderia ser a primeira vitória de Felipe Massa ou Valtteri Bottas na temporada. Em um ano em que muitos reclamam da monotonia das corridas, a mudança de posição na volta inicial tornou o GP da Inglaterra um dos mais emocionantes de 2015.
 
E a mesma coisa aconteceu três semanas mais tarde, em Hungaroring, no GP da Hungria. Novamente, as Mercedes ocupavam a primeira fila, mas foram as duas Ferrari que fecharam a volta 1 nas duas primeiras posições. Em um circuito mais travado, Sebastian Vettel controlou as ações a partir de então para vencer pela segunda vez no ano – em uma etapa ainda melhor que a britânica. Já Lewis Hamilton e Nico Rosberg, no meio do bolo, se complicaram e terminaram fora do pódio – a Mercedes não sabia o que era isso desde o GP do Brasil de 2013.
 
É por essas e outras que muita gente entende que não é preciso fazer a F1 passar por uma revolução para que as corridas voltem a ser emocionantes e atraentes para o público – há pequenos detalhes que podem fazer a diferença.
Vettel, 3º, Räikkönen, 5º: as Ferrari fecharam a primeira volta nas duas primeiras posições (Foto: AP)
O que muda?
 
A FIA decidiu aumentar, para o GP da Bélgica, o controle sobre o item do regulamento que exige que os pilotos guiem os carros por conta própria na categoria. Isso vai se estender principalmente às mensagens de rádio e às instruções passadas pelos engenheiros aos pilotos durante as atividades. As largadas se enquadram nisso. 
 
Ao longo do fim de semana, os pilotos fazem diversas simulações para encontrar o ponto ideal da embreagem para aquele circuito – algo que depende também dos pneus usados em cada etapa e até mesmo do tipo de asfalto.
 
O piloto tem no carro de F1 duas alavancas de embreagem, as quais opera com as mãos. A do lado direito, solta assim que as luzes vermelhas se apagam. A do lado esquerdo, quando sente que a tração está adequada. Mal comparando, é como o “ponto” do pedal da embreagem no seu carro de rua.
 
Até a corrida passada, os últimos ajustes, ainda que mínimos, eram feitos entre a volta de apresentação e a largada. O engenheiro, com o auxílio da telemetria, recomendava alterações aos pilotos. Agora, no entanto, tais conversas passam a ser proibidas, e o ponto da embreagem também não poderá ser modificado após o carro sair da garagem para alinhar no grid. Caberá exclusivamente ao piloto sentir o carro para entender como fazer uma boa largada.
Ajuste da embreagem da Williams é feito pela alavanca "CLCH", abreviação para "clutch" (Foto: Red Bull/GEPA/ Harald Steiner)
Qual será o impacto?
 
Jenson Button, o piloto mais experiente da F1 atual, acredita que o impacto será mínimo neste primeiro momento. “Basicamente, você precisa ter memória”, comentou. “Normalmente, nos dizem cinco segundos antes de fazermos alguma coisa, mas agora teremos de lembrar isso por dez minutos. Então acho que vamos dar conta.”
 
Engenheiro-chefe da Williams, Rob Smedley pensa que ninguém deve ser muito prejudicado – mas que um grave erro pode ter consequências sérias. “O máximo é que, se alguém errar feio, pode ser cruel. Eu não acho que vai ter uma grande diferença na largada das corridas. A performance de todos pode piorar, pois não teremos mais as configurações perfeitas da embreagem, mas, na média, não fará uma grande diferença”, falou após o anúncio das medidas, em julho.
 
Já o tetracampeão Sebastian Vettel é um tanto reticente. “Realmente não entendo o que estamos tentando atingir. Não acho que vá mudar muita coisa. Talvez seja um pouco caótico no domingo, e talvez no próximo domingo, mas têm muitas pessoas espertas na F1. Acho que os pilotos são capazes de fazer muitas coisas”, destacou. “Acho que daqui duas ou três corridas, nada vai mudar.”

Para o GP da Bélgica, embora a reta dos boxes seja curta, é possível esperar que a novidade embaralhe ao menos um pouco a ordem do pelotão.

Para 2016, os carros continuarão tendo duas embreagens, mas apenas uma poderá ser usada nas largadas. Em 2017, uma embreagem padrão deve ser introduzida. 

Como a largada interfere na corrida?
 

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Uma das razões pelas quais Ayrton Senna era obcecado por pole-positions era porque ele sabia que, estando à frente dos principais adversários, era muito mais fácil controlar a corrida em busca da vitória. Não à toa, conquistou 40 de suas 41 vitórias largando das duas primeiras filas. A única exceção foi o GP dos Estados Unidos de 1990, em Phoenix, quando saiu em quinto. Foram 29 triunfos partindo da pole.

 
Vettel, vencedor na Hungria, é outro. Em todas as suas 41 vitórias, largou ao menos na terceira posição, sendo que converteu pole em vitória em 27 ocasiões. O recorde de vitórias partindo da pole pertence a Michael Schumacher, 40 (nem metade de seus 91 triunfos).
 
Mas tomemos exemplos recentes para tratar melhor o assunto. Já foram citadas as duas últimas corridas da F1, na Inglaterra e na Hungria. Na primeira a tendência era que a Mercedes abrisse para a Williams e tivesse uma briga interna entre Hamilton e Rosberg pela vitória. Uma vez atrás de dois carros bem rápidos de reta, ficou difícil recuperar a posição – só nos boxes isso aconteceu. Na Hungria, por melhor que fosse o ritmo de Vettel, dificilmente ele ultrapassaria. A posição de pista tem uma importância gigantesca.
 
Largadas boas ou ruins podem influenciar inclusive a briga pelo título. Durante a maior parte da temporada 2014, por exemplo, Rosberg teve muitas dificuldades para lidar com a embreagem da Mercedes e segurar Hamilton – ainda que tenha superado o companheiro de equipe em poles, 11 a 7. Ele foi mal em várias oportunidades, como no Bahrein, na Bélgica e na decisão em Abu Dhabi.
Rosberg passou Hamilton na largada para assumir a liderança do GP da Áustria (Foto:AP)
E o inverso vem acontecendo desde o GP da Áustria deste ano. Na maior parte das corridas de 2015, o inglês largou na frente e ditou o ritmo da prova. O maior exemplo foi o GP da China, quando Rosberg reclamou que Lewis estava muito lento e que isso o prejudicava. Tudo o que o bicampeão fazia era gerenciar o desgaste de pneus do seu carro enquanto administrava a distância para o colega.
 
Contudo, nas provas mais recentes, é Hamilton que tem se complicado. No Red Bull Ring, perdeu a ponta na primeira volta e não foi capaz de dar o troco. Na Inglaterra, só passou de volta nos boxes, e, na Hungria, a largada ruim o levou a cometer outro erro ainda no giro inicial e cair para décimo.
 
Estes são exemplos referentes apenas à briga pela vitória. Há dois pilotos que têm construído a própria sorte nas corridas graças a largadas boas – ou ruins. Nico Hülkenberg, da Force India, tem consistentemente ganho posições na primeira volta, e isso o ajudou a ser sétimo na Inglaterra. Na Hungria, abandonou quando estava em sétimo devido a uma falha mecânica. Daniel Ricciardo, por sua vez, não tem conseguido posições ruins no grid, mas perde muitas na volta inicial, o que certamente prejudica sua contagem de pontos.
 
Em suma, a largada é o momento ideal para que os pilotos com carros inferiores tentem superar aqueles que têm um equipamento superior, ou para que se conquiste a vantagem da posição de pista em relação a um rival de força equivalente.
Na Indy, Tony Kanaan criou fama por ganhar posições nas largadas e relargadas (Foto: Beto Issa)
E nas largadas lançadas?
 
Tony Kanaan ganhou fama na Indy por fazer ótimas largadas e relargadas. Como? Nem ele sabe. “Acho que aprendi o timing das largadas quando me mudei para o automobilismo americano, e também porque sou bom de pneu frio”, falou o piloto da Ganassi ao GRANDE PRÊMIO.
 
Na Indy, devido às muitas variáveis que surgem durante as provas, nem sempre a largada acaba tendo um grande impacto no resultado final. Mesmo nos circuitos mistos, o alto número de bandeiras amarelas faz com que se adote uma cautela maior na primeira metade da prova, guardando para o final.
 
Para Tony, as exceções acabam acontecendo nos ovais curtos, como Iowa e Milwaukee. “Você não vê ninguém poupando tempo ou ficando lá atrás em um oval curto, pois, se você pega uma bandeira amarela na hora errada, pode perder uma volta ou até mais. Em compensação, nos ovais grandes, como Indy ou Fontana, você pode largar lá atrás, pois no começo estão todos se poupando ou medindo a concorrência. Nas 500 Milhas de Indianápolis, o pau quebra mesmo é depois da volta 150, antes disso você quer estar ali no top-10, top-5”, avalia. 
 
Mas não é por isso que largar na frente deixe de ser motivo de preferência. “Claro que o objetivo é sempre largar na frente ou ganhar o máximo de posições. Caso largue atrás ou perca muitas posições, os engenheiros começam a fazer contas para ver qual o melhor momento para fazer a parada. Isto vai variar muito de pista para pista, duraçãoo da corrida e até o consumo de combustível que o piloto está conseguindo em dado momento da prova”, diz. “Com as contas em mãos, os engenheiros vão traçar uma estratégia para tentar ganhar posições com uma parada antes ou depois dos outros. Nessa hora, as amarelas têm uma participação fundamental, pois você tem de mudar todo o plano que já estava traçado.”
 
Nos ovais, ainda há outro detalhe: uma boa largada pode fazer o piloto ganhar muitas posições não só de cara, mas também nas voltas seguintes. O “embalo” e os movimentos corretos no vácuo dos outros carros costumam gerar grandes saltos. Como no caso daquela que Tony considera ter sido a sua melhor largada: Phoenix 2005. “Tive um problema no motor e larguei lá atrás. Em dez voltas, já estava em sétimo.”
Na Indy, as relargadas também são atrações (Foto: AP)
O que fazer com as relargadas na F1?
 
Foi levando em conta a expectativa que se cria em torno de uma largada que a FIA lançou a ideia de se introduzir relargadas paradas na F1 em 2015. Era um exagero, tanto que a recepção foi negativa e o plano foi abortado. Mas o exemplo da Indy não seria má ideia: nas relargadas, em vez de o líder ditar o ritmo, o comando poderia ser dado pelo diretor de prova. Assim, os pilotos ficariam mais próximos e a probabilidade de mudanças de posição acontecerem aumentaria.
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