Coluna Warm Up, por Flavio Gomes: Amigos Jorge e Juan

Jorge Araújo e Juan Esteves eram fotógrafos que me acompanharam na minha primeira cobertura 'in loco' de F1, no GP do Brasil de 1988, em Jacarepaguá


Amigos Jorge e Juan, 
 
A maioria dos meus leitores não conhece vocês de nome, e eles estarão lendo esta carta que, claro, deveria ser particular, pessoal, não se viola a correspondência de ninguém, mas são novos tempos, amigos. E se não for assim, compartilhado com todo mundo, é como se não existisse. Qualquer coisa, hoje em dia. Um texto, uma foto, um vídeo. Compartilhe, ou não exista.
 
Mas não se incomodem, não cometerei indiscrições. Meus leitores podem ler. E espero que vocês também leiam.
 
Jorge Araújo e Juan Esteves, leitores, é deles que estou falando. Fotógrafos. Ou repórteres fotográficos, como lá no jornal tentavam (a chefia, não os fotógrafos) fazer com que os chamássemos. Para mim, eram fotógrafos e estava de bom tamanho. Precisa mais? Afinal, era tão óbvio que eram repórteres também, que eu dispensava o título pomposo e comprido. Eu e todos. O editor mandava “pegar um fotógrafo” e sair para fazer matéria. Jamais me mandaram “pegar um repórter fotográfico”. Hoje, noto que “câmeras”, na TV, também são “repórteres cinematográficos”. Bobagens. Eu não era “repórter de texto”. Era apenas “repórter”. E meus amigos das lentes, “fotógrafos”. E não se fala mais nisso.
 
Juan e Jorge estavam na equipe que foi para Jacarepaguá naquele verão de 1988. GP do Brasil, 25 anos atrás, minha estreia em coberturas de Fórmula 1.
 
Escrevi sobre isso no meu blog, meninos. Acho até que mencionei vocês. Claro que mencionei. Contei, tintim por tintim, como vocês trabalhavam e mandavam fotos para a Redação, com R maiúsculo como pedia, e ainda pede, nosso Manual. De Redação.
 
Vocês não fazem ideia de como as pessoas se espantam com as coisas que eu contei. Fazer dez minutos de treino, uns dois ou três filmes, sair correndo para o Motel Monza na garupa de uma moto, se enfiar naquele cubículo que o dono, amigo de vocês, transformou em laboratório, revelar os filmes, ampliar, pendurar para secar, ligar a maleta de telefoto na linha, escolher as melhores, puxar a extensão do telefone, arrancar o bocal, conectar as garrinhas, discar, esperar alguém lá no quarto andar atender, dar o sinal, começar a girar o cilindro, rezar para não cair a linha, 20 minutos por foto, e no fim dava tudo certo.
 
Imagino que as coisas sejam mais fáceis para vocês hoje. Para nós, que escrevemos, também são. Naquela corrida a gente se virava nas máquinas de telex, lembram? Telex. Barbaridade. Uma briga para pegar as máquinas antes dos caras do “Estadão”… A turma do “JB” e do “Globo” tinha mais estrutura, as redações eram lá mesmo no Rio, mas a gente tinha de disputar aquelas benditas máquinas a tapa, os repórteres da Sucursal do Rio corriam para o jornal lá no Centro, textos enviados de todos os lados, fotos, telefonemas, não tínhamos celular, não existia celular, e no fim dava tudo certo.
 
Sempre dá. Uma das verdades universais é essa, vocês conhecem bem: no dia seguinte sempre sai o jornal. Só não sei até quando.
 
Jorge, acho que você ainda está na “Folha”. Não faz o dia a dia, nem deve, já está em outra. Não precisa mais amassar tanto barro. Não precisa atravessar a pista correndo, como fez naquele ano, e no ano seguinte não te deram credencial por causa disso. Juan, soube que você está na faculdade, tirando o diploma para poder dar aula. Sorte de seus futuros alunos. Vocês dois têm muito a contar e a ensinar.
 
Mas voltando a 1988, lembram do pardieiro em que ficamos, na Barra? Um daqueles prédios com 200 apartamentos por andar e 40 andares, num condomínio de 50 edifícios. Eu pegava as lentes, a 300 e a 600 (eram essas?), para ficar espiando os outros apartamentos. A gente chegava arrebentado do autódromo, vocês tomando cerveja e vendo TV, os outros repórteres que tinham lá suas paradas no Rio se mandavam para a noite, e cada vez que eu achava alguma menina trocando de roupa numa das janelas, chamava e vocês vinham correndo. Às vezes apareciam uns caras pelados e eu chamava do mesmo jeito, e vocês me xingavam e continuavam vendo TV.
 

Não esqueço também da cama que vocês prepararam para mim naquele apê alugado pelo jornal para o fim de semana. Um berço. “Berço do Flavinho”, indicava um cartaz. Quando eu cheguei, vocês me colocaram no berço e tiraram uma foto. Hoje, teria ido parar no Instagram e seria um sucesso. Ainda tenho a foto. É essa aí, digitalizada dez anos atrás. Está pequenininha, mas dá para ver. Vou procurar em casa o original, e se encontrar prometo… colocar no Facebook, OK?
 
Eu guardo tudo. Não sei onde, mas guardo.
 
Como vocês, creio. Guardamos tudo, especialmente as lembranças. Era minha primeira cobertura de F-1. Vocês já eram veteranos, já tínhamos saído para algumas pautas menos emocionantes, quando eu era repórter de Educação e Ciência. Eu, um menino, aprendendo com cada palavra, cada gesto, cada clique, cada foco, cada lente, cada sugestão. Pô, afinal era o Jorge, que tinha feito a maior foto das Diretas na Sé. Afinal era o Juan, que viria a fazer a maior foto do Lula na campanha presidencial.
 
Foram-se 25 anos, meninos. Seguimos na estrada.
 
Abraços.

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